Após ter sido aprovada na Assembleia da República em 10 de fevereiro em votação final global (com os votos favoráveis apenas do PS, a abstenção do PSD, Chega, PAN e Livre e votos contra do BE, PCP e IL) e publicada em Diário da República (Lei nº 13/2023, de 3 de abril), entrou em vigor neste 1 de maio diversas alterações ao Código de Trabalho, no âmbito da “Agenda do Trabalho Digno”.
As alterações à lei laboral entram hoje neste Dia do Trabalhador, sem que o diploma tenha obtido acordo na Concertação Social.
O Presidente da República promulgou o decreto-lei, mas manifestou dúvidas quanto aos efeitos de algumas soluções que, “podem porventura vir a ter, no mercado de trabalho, um efeito contrário ao alegadamente pretendido”.
As confederações patronais apontam inconstitucionalidades ao diploma, enquanto as centrais sindicais consideram que as medidas são insuficientes para garantir os direitos dos trabalhadores.
A “Agenda do Trabalho Digno e de Valorização dos Jovens no Mercado de Trabalho” inclui 70 medidas ao serviço dos trabalhadores e das empresas, assentando em quatro eixos principais: combater a precariedade; valorizar os jovens no mercado de trabalho; promover uma melhor conciliação entre a vida profissional, pessoal e familiar; e dinamizar a negociação coletiva e a participação dos trabalhadores.
Quais são as principais medidas dedicadas ao combate à precariedade e aos jovens trabalhadores?
A duração dos contratos temporários passa a ter limites máximos, quando esteja a ser desempenhada a mesma função, ainda que a entidade empregadora seja diferente.
É reduzido para quatro o número de renovações dos contratos temporários.
O período experimental é reduzido para jovens que já tenham tido contratos a termo na mesma atividade, mesmo que com outro empregador.
Passa a ser proibida a utilização de outsourcing durante um ano após um despedimento coletivo ou por extinção de posto de trabalho.
Os estágios profissionais passam a ser remunerados no mínimo por 80% do Salário Mínimo Nacional, e as bolsas de estágio IEFP para licenciados são aumentadas para 960€.
É reforçada a proteção dos direitos dos jovens trabalhadores-estudantes, passando a poder acumular o abono de família e as bolsas de estudo com o salário.
É duplicado o valor da compensação pela cessação dos contratos a termo, como forma de dissuadir a celebração de contratos a termo não justificados.
Quais as principais alterações quanto às licenças?
A licença de parentalidade exclusiva do pai passa dos atuais 20 para 28 dias consecutivos.
Passa a haver um aumento do subsídio quando as licenças parentais são partilhadas de forma igual entre pai e mãe, e a partir dos 120 dias, a licença pode ser utilizada em part-time por ambos os progenitores, aumentando a duração total.
É criada a licença por luto gestacional, que pode ir até aos três dias.
A licença por falecimento do cônjuge passa dos atuais cinco dias para 20.
O direito ao teletrabalho, sem necessidade de acordo, é alargado aos pais com crianças com deficiência, doença crónica ou doença oncológica.
São alargadas as dispensas e as licenças a quem quer adotar ou ser família de acolhimento.
Os cuidadores informais vão ter mais tempo para dedicar à pessoa que acompanham?
Os cuidadores informais não principais passam a ter uma licença de cinco dias e o direito a 15 dias de faltas justificadas.
Além disso, os cuidadores informais passam a ter direito a teletrabalho, horário flexível ou tempo parcial.
Passam a estar abrangidos pela proteção contra o despedimento e discriminação.
Que medidas prevê a Agenda para combater o trabalho temporário injustificado?
As empresas de trabalho temporário passam a ser obrigadas a ter um quadro de pessoal permanente e o número de renovações dos contratos é reduzido para quatro.
A compensação pela cessação de contratos de trabalho temporário aumenta de 18 para 24 dias por ano.
São ainda estabelecidas regras mais rigorosas e exigentes para as empresas de trabalho temporário, como a obrigação de certificação, aumenta-se a responsabilização e ainda a exclusão de sócios, gerentes ou diretores que tenham sido condenados por contraordenações laborais.
Os trabalhadores das plataformas vão ter contrato de trabalho?
As alterações preveem que os trabalhadores das plataformas digitais, como Uber ou Glovo, são considerados trabalhadores por conta de outrem, tendo todos os direitos como qualquer trabalhador.
Por outro lado, as plataformas passam a ter o dever de informação e transparência sobre o uso de algoritmos e mecanismos de Inteligência Artificial na seleção e dispensa dos trabalhadores.
Alargamento do teletrabalho
O direito ao teletrabalho é alargado a pais com filhos com deficiência, doença crónica ou doença oncológica, independentemente da idade.
Segundo o novo artigo, “o trabalhador com filho com idade até três anos ou, independentemente da idade, com deficiência, doença crónica ou doença oncológica que com ele viva em comunhão de mesa e habitação, tem direito a exercer a atividade em regime de teletrabalho, quando este seja compatível com a atividade desempenhada e o empregador disponha de recursos e meios para o efeito”.
Despesas de teletrabalho fixadas no contrato
O diploma passou a prever a fixação do valor das despesas adicionais nos contratos para prestação de teletrabalho.
“O contrato individual de trabalho e o contrato coletivo de trabalho devem fixar na celebração do acordo para prestação de teletrabalho o valor da compensação devida ao trabalhador pelas despesas adicionais”, define a lei.
O limite de isenção fiscal e contributivo das despesas em teletrabalho ficou por definir por portaria do Governo.
Que impacto tem a Agenda na contratação coletiva?
A Agenda passa a consagrar medidas de discriminação positiva para as empresas com contratação coletiva dinâmica no acesso a apoios públicos nacionais e europeus, bem como a incentivos financeiros e fiscais.
Por outro lado, alarga-se a contratação coletiva aos trabalhadores em outsourcing e aos trabalhadores independentes economicamente dependentes, procurando incentivar a participação ativa de todos no diálogo social, acabando com as exclusões de pessoas em função do tipo de contrato.
Como medida estrutural, a Agenda aprova um novo mecanismo de arbitragem para evitar que existam vazios na contratação coletiva, promovendo uma negociação dinâmica entre empregadores e trabalhadores.
A semana de quatro dias está na Agenda?
Sim. Já em 2023, vai ser desenvolvido um projeto-piloto, de base voluntária e sem perda de rendimento.
Vai haver alterações nas baixas médicas?
Os trabalhadores passam a ter a possibilidade de obter baixa médica através do serviço SNS 24, ou seja, sem recorrerem a uma consulta num hospital ou centro de saúde.
Essas baixas, obtidas sob compromisso de honra, podem ser pedidas até duas vezes por ano, por períodos máximos de três dias.
À semelhança do que acontece com as baixas passadas por médicos, estes dias de baixa até três dias não são remunerados, pelo empregador ou pela Segurança Social.
A baixa média poderá ser pedida através da área pessoal no site do SNS24.
Valor das horas extra aumenta a partir das 100 horas anuais
O valor das horas extraordinárias a partir das 100 horas anuais passa de 25% para 50% na primeira hora ou fração desta, de 37,5% para 75% por hora ou fração subsequente, em dia útil, e de 50% para 100% por cada hora ou fração, em dia de descanso semanal, obrigatório ou complementar, ou em feriado.
Esta norma entra em vigor hoje, mas as associações patronais e sindicais têm um período transitório, até 1 de janeiro de 2024, para alterarem as convenções coletivas.