Chegar ao Natal significa também chegar a uma das épocas do ano em que sobem o número de doenças provocadas por alimentos contaminados. Estas podem ser muito mais do que uma dor de estômago e transformar-se em graves problemas de saúde. Além disso, resultam também num grave problema económico.
Será que já pensou no impacto dos custos que este tipo de doenças têm na economia de um país? Ou seja, quanto nos custa não educar sobre as boas práticas de alimentação segura, em casa e fora dela?
As contas já foram feitas, em 2015, pelo Serviço de Investigação Económica (ERS), que faz parte do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA): este organismo estima que as doenças transmitidas por alimentos contaminados, causadas por patogénicos como a Salmonella, Toxoplasma gondii, Listeria monocytogenes, Norovírus e Campylobacter, custem anualmente aos Estados Unidos qualquer coisa como 15,5 mil milhões de dólares (cerca de 14 mil milhões de euros).
Este enorme encargo económico está associado a despesas médicas e à perda de produção devido a colaboradores incapazes de trabalhar, devido aos efeitos da intoxicação alimentar, que podem incluir doença e até morte prematura.
Como nos mantemos a nós e à nossa família longe destas estimativas? Podemos começar pela nossa cozinha e em particular pelo nosso frigorífico.
Como preparar o frigorífico para as festas
Felizmente, para muitos, a boa comida é parte integrante do Natal. Boa e abundante. O que resulta, muitas vezes, num frigorífico bem cheio. Tão cheio que pode dificultar a circulação de ar frio por todos os alimentos. Um frigorífico demasiadamente cheio dificulta não só a refrigeração uniforme dos alimentos como a visualização do que realmente temos lá dentro e quando e em que data vai expirar.
Estes dois fatores facilitam, sem intenção, o desperdício alimentar doméstico. Quantas vezes deu por si, ao longo da sua vida, a descobrir alimentos que já não se lembrava que tinha ou que achava que ainda estavam bons?
Por isso é tão importante saber manter a temperatura do frigorífico baixa (máximo de 4°C) para evitar que os alimentos se estraguem ou se tornem perigosos para a sua saúde (isto são coisas diferentes). Regra geral, ao reduzir a temperatura do seu frigorífico de 8°C para 4°C, pode manter os alimentos duas vezes mais tempo, antes de se tornarem inseguros ou visivelmente estragados.
Quão frio está o seu frigorífico?
Num projeto relativamente recente da União Europeia, vários investigadores da Noruega, de Portugal, da França, da Inglaterra e da Roménia foram verificar as temperaturas dos frigoríficos domésticos de 75 cozinhas europeias. A temperatura das prateleiras onde os consumidores armazenavam os alimentos mais perecíveis foi registada durante 14 dias.
A temperatura média foi de 5,5°C, sendo que um em cada três frigoríficos tinha uma temperatura superior a 6°C. Será que 2ºC (dos ideais 4ºC para 6ºC) fazem assim tanta diferença?
Fazem toda a diferença. Especialmente, quando se percebeu que as temperaturas mais altas foram encontradas em casas com idosos. Aproveite este Natal e ajude os seus idosos a melhorar a temperatura real e interna do frigorífico.
As cozinhas de casas onde habitavam idosos tinham um frigorífico acima de 12°C, e a temperatura média era de apenas 7°C, aproximadamente. Um valor perigosamente alto. Perigoso para a saúde e para o desperdício alimentar. Recordo que os idosos fazem parte dos grupos de risco: pessoas mais vulneráveis em termos de infeções alimentares, especialmente listeriose.
O que é a Listeria monocytogenes e porquê tantos cuidados?
A Listeria monocytogenes pode causar a listeriose, uma doença que tem elevada taxa de mortalidade. Enquanto as bactérias “suas primas”, como a Salmonella ou a E.coli não se desenvolvem bem em condições normais de refrigeração, a Listeria “adora” a temperatura do frigorífico.
E se a temperatura do frigorífico ultrapassar os 4°C, as bactérias crescem ainda mais rápido do que o normal. Poém desengane-se se acha que irá notar a diferença no sabor ou no cheiro dos alimentos. Elas designam-se de patogénicas, porque podem envenenar o nosso alimento sem nunca denunciar a sua presença. Daí a importância da alimentação segura como ferramenta base para uma vida saudável.
As pessoas idosas, as mulheres grávidas e as pessoas imunocomprometidas são particularmente vulneráveis à listeriose.
Atenção extra aos alimentos prontos a comer
Preste especial atenção aos alimentos prontos a consumir, marcados com a data de validade, como os queijos de pasta mole, os enchidos e os peixes fumados. Talvez não saiba mas têm sido frequentes os surtos de Listeriose devido a salmão fumado.
No entanto, como para os alimentos feitos em casa, não foi estudada uma data de validade, pode ser difícil decidir quanto tempo podem ficar guardados.
As sobras da ceia de Natal – a roupa velha – devem ser arrefecidas rapidamente e reaquecidas completamente, no dia 25, antes de serem consumidas. Essas sobras podem ser guardadas com segurança durante 3 a 4 dias no frigorífico se a temperatura máxima for de 4°C. Mas se a temperatura subir para 8°C, então os alimentos são seguros por menos tempo e podem acabar por se estragar rapidamente.
Manter os alimentos frios e não os deixar esquecidos por muito tempo é a melhor opção
Um grupo de trabalho investigou se as pessoas conseguiam determinar as temperaturas dos frigoríficos apenas ao tocar nos alimentos. A resposta é clara: infelizmente, não. É por isso que precisa de um fiel amigo na sua cozinha. E não, não estou a falar do bacalhau, mas sim de um termómetro.
Pediu-se a 320 consumidores que tocassem em diferentes itens refrigerados (lata de cerveja, garrafa de vidro) e que adivinhassem a temperatura. E no final, percebeu-se que as pessoas estimavam temperaturas mais baixas do que a temperatura real.
Embora os frigoríficos tenham, geralmente, um display com a temperatura, essa informação pode ser imprecisa e não mostrar a temperatura real dos alimentos. Precisa monitorizar com um termómetro portátil que encontra em vários hipermercados e estar ciente de que a temperatura pode ser diferente nas várias prateleiras. A temperatura nos compartimentos da porta é normalmente a mais alta, uma das razões para evitar que lá coloque alimentos perecíveis, como os ovos.
Dicas para manter os seus alimentos mais seguros
- Respeite e siga as instruções de conservação mencionadas na rotulagem:
- Não coma alimentos após a data de validade (data limite de consumo)
- Cozinhe os alimentos de acordo com as instruções do rótulo
- Certifique-se de que a temperatura do frigorífico está, no máximo, a 4°C.
Conselhos adicionais para alimentos sem data de validade
- Não coma alimentos após cinco dias de armazenamento.
- Congele os alimentos que não espera consumir dentro de cinco dias.
- Coloque os alimentos no frigorífico no prazo de duas horas e nunca deixe os mais perecíveis (como as carnes cozinhadas) esquecidos à temperatura ambiente – cerca de 22° -, por mais de 120 minutos. Lembre-se que, quanto mais tempo ficar em cima da bancada, mais toxinas são produzidas. E é mais fácil queimar a “roupa velha” do que destruir essas toxinas. O fogo não destrói tudo.
- No caso das sobremesas cuja receita recomenda ovos caseiros, pondere o uso de ovos pasteurizados, à venda nos hipermercados. Assim diminui o risco de “servir Salmonella à família”. Use os ovos caseiros nas receitas que vão ser bem cozidas, como um bolo de noz ou algo similar.
As intoxicações alimentares são contagiosas?
As intoxicações alimentares podem ser contagiosas, especialmente aquelas causadas por bactérias e vírus como o caso do Norovírus, que podem espalhar-se de pessoa para pessoa. No entanto, as intoxicações decorrentes de toxinas ou substâncias químicas nos alimentos geralmente não são contagiosas. A prevenção envolve práticas como uma simples, mas boa lavagem das mãos, evitar a manipulação de alimentos enquanto está doente, adotar medidas seguras de armazenamento e fazer uma preparação segura dos alimentos.
Num espírito natalício de cuidado e partilha, recordemos que a alimentação segura é um presente valioso para todos. Que neste Natal, ao desfrutarmos das receitas festivas, possamos também cultivar hábitos conscientes e mais seguros na preparação e conservação dos alimentos.
Desejo-lhe um Natal repleto de alegria, saúde e momentos de boas partilhas à volta da mesa. Que a luz desta época ilumine não apenas os nossos corações, mas também as práticas mais seguras que garantem festas saudáveis e memoráveis. Boas festas!
(Texto escrito pela autora Susete Estrela)