Durante o Mundial 2023, a Forbes Portugal fez a pergunta: Porque choras, Espanha? Se até esse momento ainda não estava claro para todos o que se passava dentro de portas entre as jogadoras da seleção, a equipa técnica e a Federação, depois da final do Mundial chegou a confirmação que alguns ainda precisavam. E não demorou muito tempo.
O friso cronológico é mais ou menos assim: Logo após o apito final, Luis Rubiales, o presidente da federação espanhola, foi visto a fazer gestos obscenos na bancada. No relvado, pouco tempo depois, deu um beijo a Jenni Hermoso sem o consentimento da jogadora. Já no balneário, brincou sobre um futuro casamento com a mesma jogadora. Durante um direto no Instagram, Jenni reagiu ao sucedido dizendo que não gostou e questionando: “Mas o que ia eu fazer?”.
A partir desse momento, nas redes sociais multiplicaram-se os comentários contra a atitude de Rubiales e a opinião da maioria era simples: O presidente da Federação teria de se demitir.
Avançando até à manhã da passada sexta-feira, chegou a resposta do próprio. “Não me demito”, gritou repetidas vezes durante uma assembleia. E não ficou por aí. “Foi espontâneo, mútuo, eufórico e consensual, que é a chave de todas as críticas, de todo o processo que foi montado neste país de que foi não consentido. Não, foi consensual, foi consensual”, afirmou, mesmo depois de já ser conhecida a versão da jogadora.
Rubiales seguiu mencionando coisas como o “assassinato social” de que diz estar a ser alvo, ou o “falso feminismo” que diz haver por aí. “O falso feminismo não procura a justiça, não procura a verdade, não se preocupa com as pessoas. Repito: estão a preparar uma execução para colocar uma medalha e dizer que estão a fazer progressos. Mas não é assim que estamos a avançar, é o contrário”, defendeu.
O que recebeu em troca? Uma verdadeira lição sobre o que é, afinal, o feminismo.
As restantes jogadoras espanholas vieram em defesa de Jenni Hermoso. “Isto é inaceitável. Acabou-se. Contigo, companheira”, escreveu Alexia Putellas nas redes sociais. “Toda o mundo viu o que aconteceu. Tu és a vítima”, sublinhou Irene Paredes. “Há limites que não podem ser ultrapassados e isto não pode ser tolerado”, acrescentou Aitana Bonmatí.
Ao contrário do que aconteceu quando as “Las 15” enviaram o e-mail à Federação, desta vez não houve qualquer divisão entre as jogadoras. Estão todas do lado de Jenni. As que recusaram jogar o Mundial, mantendo a posição que assumiram nesses e-mails, também se manifestaram.
“Não foi preciso muito tempo para se ver que o que foi exigido há alguns meses não era apenas uma simples birra. As imagens falam por si, e penso que não há muito mais a acrescentar. É inaceitável. Por todas as mulheres”, escreveu Mapi León nas redes sociais.
Em Portugal, as jogadoras também se fizeram ouvir. “Não é falso feminismo. É um discurso vergonhoso de Rubiales! Pior? Os aplausos de toda uma sala”, afirmou Tatiana Pinto. “É de loucos. Inaceitável!”, sublinhou Jéssica Silva. E como as portuguesas, muitas jogadoras de várias nacionalidades fizeram o mesmo. Como Marta, Alex Morgan, Megan Rapinoe, toda a seleção inglesa, entre outras.
Além da união entre as mulheres, há também a solidariedade dos homens. “Tomei a decisão de não regressar à seleção nacional. Estou triste e desiludido”, anunciou o espanhol Borja Iglesias. “Teríamos de passar estes cinco dias a falar das nossas meninas! Da alegria que nos deram a todos! De nos vangloriarmos de um título que não tivemos no futebol feminino, mas…”, escreveu Iker Casillas.
Jogadores, clubes, ministros, sindicatos, a liga. As reações não pararam ao longo de todo o dia. Se é verdade que no final da assembleia Rubiales recebeu aplausos em pé de todos os presentes, do lado de fora é por Jenni Hermoso e qualquer outra mulher que todos se levantam. E não será esta a definição de feminismo?
Ao final do dia, e depois de toda esta onda de apoio, foi a vez da própria jogadora publicar o seu comunicado.
“As palavras do Sr. Luis Rubiales são categoricamente falsas e parte da cultura manipuladora que ele próprio criou”, começa por escrever. “Senti-me vulnerável e vitima de uma agressão, um ato impulsivo, machista, fora de lugar e sem nenhum tipo de consentimento da minha parte. Simplesmente não fui respeitada. Perante a falta de respeito e a incapacidade de reconhecer os próprios erros e assumir as consequências, tomei a decisão de não voltar a jogar pela seleção enquanto estiverem os atuais dirigentes”.
A decisão de Jenni foi partilhada por mais de 80 jogadoras espanholas, que assinaram um comunicado, através do sindicato FutPro, onde anunciam que não voltam à seleção enquanto os atuais dirigentes estiverem nos cargos.