Além de ter herdado do pai a paixão pela terra e o espírito empreendedor, Vítor Araújo diz que o sonho saiu do papel com muito trabalho e dedicação. Longe de parecer cliché, ainda hoje são assim os seus dias: 90% trabalho e 10% inspiração.
Avô, pai e neto agricultores. A grande diferença entre eles é que Vítor, o neto, não sentiu o apelo dos bichos, só o da terra. Enamorou-se pelos quivis aos 7 anos de idade por culpa do pai, que o levou a assistir a muitos colóquios sobre aquele fruto misterioso, que começou a dar-se a conhecer em Portugal em finais da década de 1970.
Os pais de Vítor são transmontanos, de Azeda, uma aldeia perto de Bragança, onde este viveu até aos 5 anos. Depois, a família mudou-se para Felgueiras, quando o pai adquiriu uma propriedade. Continuou a dedicar-se ao sector do leite até que, em 1980, resolveu experimentar os quivis com uma plantação de dois hectares.
Quis crescer mais um pouco e, em 1986, plantou mais 6 hectares em Guilhabreu, Vila do Conde, que acabaria por vender pouco tempo depois, uma vez que lhe surgira a oportunidade de comprar uma propriedade de 20 hectares em Briteiros, Guimarães, onde está sediada a Kiwi Greensun. Mas antes de o negócio dos quivis ganhar forma, houve um tempo de experiências. Vítor recorda com algum gozo: “Quando tinha 12 anos fiz um viveiro em sociedade com o meu pai, onde multiplicámos plantas de estaca, em camas de areia, com rega controlada… Chegámos a vender 2500 plantas em vaso. Correu bem”.
Desde cedo que a agricultura e o mundo dos negócios lhe são familiares. Procurar soluções e encontrar oportunidades de negócio em qualquer situação, fazem parte do ADN de Vítor. Foi assim que, aos 20 anos de idade, o empreendedor sentiu que tinha chegado o momento de avançar por conta própria.
Vítor recorda que, na altura, estava a ajudar o pai na poda dos quivis e em conversa propôs-lhe que lhe arrendasse uns quantos hectares para se lançar como jovem agricultor. “O meu pai disse logo que sim”, recorda.
Estava dado, assim, o primeiro passo para a construção da Kiwi Greensun.
Mãos à obra
Ao fim de uns anos a plantar, colher e vender muitos quivis, Vítor queria deixar de vender a fruta no campo para fugir à especulação do mercado. Isso implicava ter uma estrutura, o mesmo é dizer um armazém e câmaras frigoríficas.
Só assim é que podia fazer o amadurecimento dos quivis e, desta forma, estar no mercado quase o ano inteiro. Foi ver o que havia em Itália – o maior produtor mundial de quivis -, e recebeu várias propostas para o armazém ideal.
Quando regressou a Portugal, andou dias e noites a fazer recortes dessas propostas até chegar a uma espécie de “fato à medida”. Tirou uma fotocópia àquela soma de papelinhos e foi junto de um fabricante saber se o podia concretizar. “A primeira pergunta que o comercial dessa empresa me colocou foi: ‘Quem é que te fez esta proposta?’
Ainda me deu vontade de rir, mas fiquei contente por saber que o meu projecto era tecnicamente viável”, conta.
O armazém, que começou em 2002 com 1800 toneladas de capacidade de frio, foi crescendo até chegar às 6 mil toneladas em 2005. Actualmente, estão a decorrer obras em Briteiros para um novo aumento e chegar às 8 mil toneladas com mais seis câmaras frigoríficas.
À data, são 16 câmaras frigoríficas, 4 câmaras polivalentes e uma câmara de expedição. Vítor confessa que gosta de saber tudo o que tem que ver com o negócio e dá um exemplo: “Ampliámos há pouco a linha de embalagem, automatizámos uma parte, e estive muito, mas muito tempo junto dos mecânicos. São coisas de que gosto”.
A história da Kiwi Greensun tem sido preenchida de grandes sucessos. Desde 2012 que o volume de negócios tem aumentado a um ritmo médio de 14% ao ano, totalizando actualmente vendas superiores a 4,4 milhões de euros – que deverão atingir os 5,1 milhões de euros no ano fiscal em curso (1 de Setembro de 2016 a 31 de Agosto de 2017).
Este feito deve-se, em grande parte, a Vítor, mas também a Fernando Cordeiro, que em 2005 tornou-se sócio da empresa e com isso deu músculo à Kiwi Greensun para alcançar novos horizontes. Com a entrada de Fernando no capital (não está no activo, embora participe nas grandes decisões do grupo), Vítor aumentou o armazém e plantou mais quivis. Mas essa não foi a única razão para se tornar no “rei dos quivis”.
Força do investimento
A Kiwi Greensun não trabalha com a grande distribuição em Portugal. Apesar de ter tido algumas conversas com as grandes retalhistas, Vítor sempre negou abrir a porta. “O consumidor final não tem escolha e o mercado nacional deixa muito a desejar. As grandes cadeias tanto pressionam que acabam por comprar o que sobra, há muita falta de critério de quem compra”, atira.
Neste momento, está com 65% da facturação dependente de um único cliente estrangeiro, mas entende que é bom se o cliente for um parceiro. Mas como é que se defende? “Com um serviço excelente, um bom produto e no dia em que deixar de trabalhar com esse cliente é lógico que vai ser turbulento, mas facilmente coloco a produção noutro lado qualquer. Se tiver qualidade vende sempre”, responde.
No ano passado, a Kiwi Greensun foi reconhecida como uma Organização de Produtores. Vítor e a mulher, Cláudia Leite, detêm 57% do capital da empresa, a família de Fernando 40% e o remanescente está nas mãos dos produtores associados. Ao todo são 300 hectares entre Guimarães, Felgueiras, Amarante, Póvoa de Lanhoso, Braga e Amares.
A produção está hoje nas 5 mil toneladas, com a Kiwi Greensun a empregar 58 pessoas no campo e 26 no armazém. “Queremos continuar a crescer, como temos vindo a fazer ao longo dos anos, mas não de qualquer forma. O grande desafio é guiar todos os que connosco trabalham pelo caminho da qualidade”, sublinha Vítor.
Foi nesse sentido que, no ano passado, Vítor e Fernando (que em conjunto detém 178 hectares) investiram cerca de 1 milhão de euros na compra de 42 hectares (só permite plantar 28 hectares). Este ano, já adquiram mais 7 hectares e está seguro de que não ficarão por aqui.
Com os 20 produtores associados, a Kiwi Greensun atinge os 300 hectares. “Damos assistência técnica, apoiamos na plantação e fornecemos, inclusive, factores de produção. Os produtores entregam a fruta à Kiwi Greensun, que faz a conservação, a normalização e a venda”, explica Vítor.
E se os últimos três anos foram menos bons para o fruto em termos de volume de produção, compensam os preços “bastante acima da média”. No ano passado, Vítor revela que pagou, em média, 64 cêntimos por quilo ao produtor. Este ano, o valor médio de venda é de 1,20 euros e o produtor irá receber 70 cêntimos em média (variedades Hayward e Bo.Erica).