Mitch Lowe, co-fundador do Netflix, tem no currículo uma longa lista de negócios, a maioria fracassados como ditam as estatísticas, mas sem stress.
Depois da televisão por subscrição é agora presidente-executivo da Moviepass, uma start-up de cinema por subscrição que, até ao momento, conta com mais de 60 milhões de euros angariados junto de investidores em três rondas de investimento, e que espera revolucionar o negócio de como se consome cinema. Contudo, nem tudo corre bem.
A Moviepass, que construiu uma base de mais de 3 milhões de assinantes com um acordo que permite aos utilizadores assistirem a um filme por dia em vários cinemas norte-americanos por um custo inferior a 10 euros por mês, está a perder dinheiro a uma taxa prodigiosa.
Durante este ano, a empresa repetidamente reformulou a sua assinatura base, forçou assinantes anuais através de um plano mensal e lidou com a queda dos preços das acções, após repetidas notícias de que a empresa estava sem fundos. Lowe e a sua equipa têm tentado de várias formas manter a empresa de pé, considerando que este é o preço a pagar por introduzir no mercado um produto inovador.
A última estratégia seguida passou por enviar um e-mail para os assinantes numa tentativa de desarmá-los. Para isso, recorreram-se de uma imagem de um cão com um lenço ao pescoço da Moviepass e com a seguinte mensagem:
“Woof! Eu sou Chloe, o director de barketing na Moviepass. Eu gostaria de explicar por que de vez em quando podes ter tido uma experiência de “ruff” connosco, mas acontece que eu sou um cão e não posso conversar. O que eu sei é que vejo estas pessoas a trabalhar como loucas para tornar a Moviepass melhor e melhor para ti o mais rápido possível. Elas estão muito gratas pela tua participação e apoio enquanto trabalham. Estamos a ouvir. Estamos a aprender. Estamos a mudar.”
Numa recente deslocação à Porto Business School, Lowe falou com a FORBES sobre a cultura de sucesso, os erros de gestão, o papel das estrelas e dos idiotas no seio das equipas, e ainda dos desafios que está a enfrentar no seu novo projecto.
O que é isso da cultura da empresa?
É a filosofia que é necessário ter para conseguir uma equipa motivada, uma empresa com evolução e longevidade asseguradas e em constante inovação.
A inovação é imperativa, mesmo numa empresa cujo produto ou serviço seja, já por si, inovador?
Claro! Veja-se o caso da Netflix que quando era uma empresa de aluguer de vídeo por correio lançou um serviço de streaming para concorrer com ela própria.
Qual é o erro mais comum que vê na gestão tradicional?
Subestimar a concorrência das empresas pequenas, mas inovadoras, é um deles. Veja a Blockbuster. Nós (Netflix) oferecemos 50% da Netflix à Blockbuster por 50 milhões de dólares e eles riram-se de nós. Sabemos o que aconteceu depois, não é? Pensar que somos os melhores, porque somos grandes e líderes do mercado é um erro que nos pode levar à falência num instante.
Valoriza o ambiente de trabalho. Há inovação também neste campo?
Eu vejo os recursos humanos como uma equipa desportiva. As estrelas não são garantia de sucesso. Veja-se o caso dos New York Yankees que tem cinco ou seis dos melhores jogadores do mundo de beisebol e perdem com equipas de segunda linha. Sem uma equipa inspirada, motivada e com uma perspectiva colectiva não se obtêm resultados.
E como é que se chega lá?
Eu costumo citar Saint Exupéry: “se queres construir um navio tens que virar a tua equipa para mar alto”. É preciso explicar às pessoas o que estão a fazer, porquê e onde queremos chegar, e não me refiro só aos números. Num ambiente em que todos se sentem parte do projecto, as pessoas superam-se. É do esforço colectivo que surgem resultados surpreendentes.
Diz que detesta idiotas…
(Risos). Sim, são as tais estrelas que apesar do currículo que trazem não acrescentam nada à equipa. Além de serem caros, são muito perigosos.
Como é que se identifica um idiota?
Eu uso a mesma técnica do Warren Buffett. Quando preciso de contratar alguém levo-o a um restaurante de comida e gente humilde e vejo como ele reage e, sobretudo, como trata as pessoas. Ao mínimo sinal de desrespeito soa o alarme. Estamos perante um idiota.
Co-fundou a Netflix e agora lidera a Moviepass. Tem outros investimentos?
Sim, tenho 17 investimentos ao todo. Metade estão a caminho da falência, dois estão bem encaminhados e os outros não sei bem o que vai acontecer.
Defende uma cultura vencedora, mas vejo que também é preciso saber perder.
Vejo sempre a parte positiva: ajuda-me nos impostos (Risos). Mais a sério, é normal. Quem tenta inovar falha muita vez. Eu não sou uma excepção.
Como está a correr a Moviepass?
Está difícil. Estamos a concorrer numa indústria em que três players dominam 65% do mercado e estão entre as pessoas mais avessas à inovação que eu conheço. Estão a fazer tudo para nos aniquilar. Até já os tivemos de processar porque eles deixaram de nos vender “produto” – lugares nos cinemas.
Dores de disrupção?
(Risos). Sim. Eles não compreendem que não é a aumentar o preço dos bilhetes a um ritmo de 3% por ano e a decidir o que os jovens querem ver que vão ter as salas de cinema mais cheias. Mas temos também dores de crescimento.
Não devia saber já qual o remédio dessa “doença”?
Foi rápido demais. A nossa facturação cresceu 15 000% em oito meses. De repente ficámos sem estrutura humana, informática e de capital que aguentasse. Precisamos de capital.
O maior accionista não consegue suprir essa necessidade?
Quando decidimos vender metade da empresa à Helios and Matheson Analytics foi com essa intenção, mas foi um erro. Um negócio como o da Moviepass, que ainda está na fase de perder muito dinheiro, não pode associar-se a uma empresa cotada.
Porquê?
Como toda a informação é pública, é como fazer salsichas e estar a mostrar ao mercado como as fazemos. Por causa dos nossos prejuízos, as acções da Helios estão sob forte pressão, o que nos tem causado dificuldades em encontrar novas fontes de financiamento. É mais um conselho que dou: não vão para a bolsa enquanto estiverem a perder muito dinheiro. É contraproducente.