Ilir Sela gosta de dizer que é uma “pizza de terceira geração”. A família numerosa deste imigrante albanês de 38 anos de idade tem tantas pizzarias que tem dificuldade em saber ao certo quantas são.
Foi devido a estas duas características que quando Ilir lançou a tecnologia que permite a pequenas pizzarias competir com colossos como a Domino’s, Little Caesars, Papa John’s e Pizza Hut, a primeira coisa que fez foi registar o seu cunhado, os seus primos e os seus amigos.
Entre eles estava Blerim Marku, o director da Pizza Club de Edgewater, em Nova Jérsia, nos EUA, um primo em terceiro grau que também crescera na zona de Nova Iorque. Na altura, a Pizza Club desenvolvia o seu negócio de recolha e de entregas por telefone, à moda antiga. Isto apesar de saber que “a Papa John’s e a Domino’s estavam a obter excelentes resultados aceitando encomendas de pizzas on-line”, afirma Blerim.
Mas, havia, um problema. Os pequenos estabelecimentos não dominavam suficientemente bem a tecnologia para desenvolverem sistemas de encomendas on-line e alguns dos agregadores digitais como o Grubhub e o Seamless eram demasiado caros.
Quando Ilir mostrou ao seu primo uma forma pouco dispendiosa de receber encomendas digitalmente — um serviço a que deu o nome de MyPizza —, Blerim foi um dos primeiros a aderir e os resultados forma imediatos: as vendas da Pizza Club, que até aí eram fracas, dispararam e, com a ajuda da Slice, a empresa está agora a facturar cerca de 800 mil euros por ano, graças também à localização típica de uma Domino’s. “Era mesmo disto que estávamos a precisar”, afirma Blerim.
Actualmente, a Pizza Club é uma das mais de 8200 pizzarias em cerca de 2200 cidades e localidades espalhadas pelos EUA que usam a plataforma de encomenda de pizzas de Ilir, entretanto rebaptizada com o nome de Slice – que em português significa “fatia”.
Graças a um financiamento de 16 milhões de euros, a Slice está agora a crescer rapidamente. No ano passado, processou entregas no valor de 80 milhões de euros e o futuro do negócio aparenta vir a ser ainda mais “saboroso”.
Segundo estimativas da FORBES, caso o volume de encomendas atinja 200 milhões de euros, as receitas da Slice poderão ascender a 20 milhões de euros, ou mais. Afinal, o mercado norte-americano das pizzas vale qualquer coisa como 36 mil milhões de euros.
Nova geração de pizzarias
À medida que as grandes cadeias se foram digitalizando, as pequenas pizzarias têm vindo a perder terreno. Segundo dados da publicação do sector PMQ Pizza Magazine, apesar de representarem 55% das pizzarias existentes nos EUA, as pizzarias independentes representam apenas 41% do total das vendas – uma percentagem que deverá continuar a cair.
Entre os colossos, tem-se assistido a uma corrida à digitalização. A Domino’s, por exemplo, é hoje uma autêntica “pizzaria 4.0” em que as vendas on-line representam mais de metade do volume de negócios anual.
Ilir acha que os consumidores estão a abandonar os estabelecimentos locais — até mesmo aqueles que oferecem ingredientes mais frescos, melhores sabores e que têm uma ligação forte com a comunidade — sobretudo por não aceitarem encomendas on-line. A ideia, segundo Ilir, “residia em saber como congregar estes estabelecimentos locais de venda de pizzas de modo a que pudessem oferecer tecnologia e conveniência. A Papa John’s, a Domino’s e a Big Pizza estão, de certo modo, a lutar entre si”, diz.
A família de Ilir vem de uma pequena localidade de nome Debar, na fronteira da Albânia com a Macedónia, que é louca por pizzas. Apesar dos pouco mais de 15 mil habitantes, a cidade tem cinco pizzarias e os expatriados dali provenientes são responsáveis pela abertura de pelo menos 50 pontos de venda de piza nos EUA.
Quando a família Ilir chegou aos EUA, na década de 1970, mudou-se para Staten Island onde começou a abrir pizzarias e onde as pessoas de etnia albanesa, muitas das quais emigradas para os EUA através de Itália, eram figuras proeminentes da comunidade pizzeira de Nova Iorque. “Trata-se de uma pequena comunidade e eles estão entre os pioneiros do negócio naquela cidade”, explica.
Por mais que Ilir gostasse de pizza, decidiu estudar tecnologia. Em 2003, depois de se formar em Ciências Computacionais pela City University do New York College de Staten Island, lançou a Nerd Force, uma empresa de webdesign que passaria a firma de serviços tecnológicos.
A empresa era conhecida pelas suas viaturas amarelas. Em 2008, vendeu a Nerd Force por cerca de 400 mil euros e usou o dinheiro para abrir a MyPizza, que oferecia duas vantagens às lojas: em primeiro lugar, ao venderem digitalmente aumentavam o volume de cada pedido, uma vez que os clientes tendem a acrescentar extras lucrativos tais como palitos de mozarela ou garrafas de refrigerante de 2 litros – Ilir afirma que a média dos pedidos dos seus clientes passou de 15 euros por telefone para 24 euros na plataforma.
E, em segundo, permitia agregar dados que, uma vez tratados, ajudavam os estabelecimentos locais a criar programas de fidelização e descontos direccionados com tremenda eficácia.
Ingredientes do sucesso
No início, a empresa contava apenas com Ilir e um engenheiro responsável pelo sítio na Internet. O orçamento de marketing não era muito grande pelo que colocou faixas à volta de um carro e estacionou-o em frente das lojas que esperava que se registassem. “Certificava-me que viam o carro,” diz. “Isso deu-nos alguma credibilidade pois pensaram que éramos uma grande empresa”, diz.
O marketing de guerrilha ajudou a Slice a expandir-se para mais de 80 restaurantes na região de Nova Iorque sem financiamento externo e com o mínimo de pessoal. Conseguiu manter os custos baixos ao instalar o escritório na sua terra natal na Macedónia, onde conta agora com 300 empregados, a maioria afectos ao tratamento de dados e à gestão de contas.
Só em 2015, quando já fazia cerca de 30 milhões de euros com encomendas, é que a Slice obteve uma primeira fatia de financiamento. Mas, na Primavera do ano passado, Ilir e Ryan Scott, director de marketing da Slice e um antigo executivo na Grubhub e na Seamless, convenceram Jeff Richards, sócio-gerente da GGV Capital, a voar de Silicon Valley para se encontrar com eles na International Pizza Expo em Las Vegas.
Ilir, que é um vendedor expansivo e enérgico, aproveitou a ocasião para criar um negócio capaz de competir com a Big Pizza, unindo dezenas de milhares de estabelecimentos familiares.
Era a grande oportunidade para a Slice ajudar os seus clientes a fixarem um melhor preço para as suas caixas e menus — e a expandirem para fora dos EUA. Para gáudio de Jeff, Ilir agarrou-a com o gosto de quem trinca uma saborosa pizza. “Como investidor, ouço falar muitas vezes de pessoas que tentam trabalhar numa indústria, mas que estão ainda a aprender como as coisas funcionam”, diz o investidor, sublinhando que, com Ilir, não foi assim.
“Neste caso estava perante alguém que cresceu com molho de tomate nas veias e que identificara um grande problema”. E, como Jeff e Ilir sabem, grandes problemas geram grandes oportunidades.