O crescente impacto da tecnologia no trabalho, agravado pelos recentes períodos de confinamento e consequente generalização do teletrabalho, motivou os investigadores Filipa Castanheira, Pedro Neves e Inês Dias da Silva, do Observatório de Liderança e Bem Estar da Nova SBE, a desenvolverem o estudo “Tecnostress – Uso da Tecnologia e Bem Estar no Contexto do Trabalho”.
Focado no stress resultante de uma utilização inadequada das tecnologias de informação e comunicação (TIC), os resultados agora apresentados revelam que uma parte substancial dos inquiridos sentem níveis elevados de tecnosobrecarga e tecno-invasão, com 47% a reconhecerem ter de mudar os hábitos de trabalho para se adaptarem às tecnologias móveis e 52% a sentirem que a sua vida pessoal é invadida devido a estes dispositivos.
Partindo do atual contexto pandémico e da hipótese de se manterem soluções de teletrabalho sustentadas pelo uso destas ferramentas, a equipa de investigadores procurou perceber melhor como é que o stress ligado à tecnologia móvel, em contexto laboral, impacta a saúde e o bem-estar dos trabalhadores.
Os investigadores quiseram igualmente identificar os grupos demográficos em maior risco de desenvolver efeitos secundários adversos como a dependência da tecnologia, exaustão e outros sintomas físicos e psicológicos.
Entre as principais conclusões, o estudo revela que uma parte substancial dos inquiridos sentem níveis elevados de tecnosobrecarga (35%) e tecno-invasão (42%), sendo que são os homens quem reporta maiores níveis de tecnosobrecarga e tecno-invasão.
Os níveis de tecnostress têm também expressão na saúde e bem estar, “estando a invasão e sobrecarga das tecnologias associadas a queixas psicossomáticas e exaustão emocional uma a duas semanas mais tarde face à exposição. Juntas explicam mais de 25% da variabilidade dos indicadores de saúde e bem-estar analisados”, aponta esta reflexão.
Como se manifesta
“Este efeito resulta principalmente do aumento da dependência das tecnologias e não da redução da motivação dos indivíduos, sendo que a dependência manifesta-se em comportamentos tais como negligenciamento de atividades importantes, incapacidade de descansar, discussões sobre o uso da tecnologia e empobrecimento da vida social”, explicam os autores do estudo.
O Observatório de Liderança e Bem Estar da Nova SBE reuniu algumas recomendações baseadas na evidência empírica, no sentido de melhorar a saúde e o bem-estar no contexto do trabalho.
Recomendações dos investigadores
Fruto da investigação realizada, a equipa sugere o desenvolvimento de politicas organizacionais para gerir o papel das tecnologias na sobrecarga e invasão, através de legislação e regulamentação interna em linha com a que foi publicada em Portugal que regula o contacto do empregador fora de horas de expediente.
Outra proposta avançada passa pela formação das chefias sobre o potencial impacto negativo “das culturas sempre conectadas, através da sensibilização para as consequências nefastas na saúde e no bem-estar do mau uso da tecnologia no trabalho. Exemplo: uma cultura que premeia respostas rápidas pode estar a premiar dependência e não engagement”.
Por fim, os cientistas sociais sugerem a capacitação dos indivíduos para a gestão ativa das fronteiras entre o trabalho e a vida pessoal e familiar, fomentando métodos de gestão da interface trabalho e vida pessoal que abranjam o uso adequado da tecnologia móvel em trabalho e nos momentos de lazer.
Ficha técnica do estudo “Tecnostress”
No período de tempo entre fevereiro de 2020 e outubro de 2021 foram disseminados mais de 4.000 questionários online, confidenciais e anónimos, a uma amostra de conveniência, com a colaboração de vários alunos da Nova SBE.
Os dados analisados correspondem a uma amostra de 4.083 indivíduos em que 51% são do sexo feminino e 49% do sexo masculino.
Quanto à idade, os indivíduos aqui representados pertencem em 30,6 % ao grupo geracional dos Baby Boomers, 34,8% pertencem à geração X, 28,1% são Millenials e 6,5% correspondem à geração Z.
A grande maioria dos participantes (62,1%) são de proveniência portuguesa a desenvolver a sua atividade profissional em um de três setores: 9% da amostra está empregado na indústria, como a farmacêutica ou alimentar, 41% representa trabalhadores da prestação de serviços como consultoria, saúde ou vendas e 50% da amostra desenvolve atividades ligadas à informação, ciência e tecnologia.